O aborto é um procedimento médico padrão praticado em todo o mundo e, mesmo assim, ainda é altamente estigmatizado em diversas sociedades. A estigmatização do aborto tem sido um fator significativo no aumento do número de abortos inseguros em todo o mundo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, 30 mulheres morrem a cada 100.000 abortos inseguros. Essas estatísticas são mais prevalentes nos países em desenvolvimento. Isso também significa que muitas pessoas em ambientes legalmente restritivos ou em ambientes de poucos recursos foram forçadas a recorrer a abortos inseguros que têm efeitos drásticos e, às vezes, até mesmo fatais.
O aborto é um procedimento médico, que envolve tomar medicamentos ou fazer uma cirurgia para interromper a gravidez. Quando os abortos são realizados usando os protocolos corretos, são altamente eficazes e seguros. Ao acabar com a estigmatização do aborto, as pessoas terão mais confiança na hora de buscar abortos seguros, diminuindo a taxa de mortalidade associada a esse procedimento.
O que é o estigma do aborto?
O estigma do aborto decorre das crenças e atitudes da sociedade em relação ao aborto. É a ideia de que o aborto é moralmente errado e socialmente inaceitável. Embora todasociedade tenha algum tipo de estigma relacionado ao aborto inseguro, muitos países têm religiões, crenças e culturas que aumentam o estigma do aborto. Por exemplo, muitas religiões são contra o aborto e o consideram um pecado.
Algumas organizações “pró-vida” também gostam de colocar em pauta o estigma da gravidez “tardia”, o que leva a falsas ideias sobre o aborto. Estes grupos usam linguagem falsa para estigmatizar o aborto, mesmo que profissionais de saúdenão usem os termos que a brigada “pró-vida” usa ou tenham uma definição diferente de quando uma gravidez é considerada avançada.
Quais são os efeitos do estigma do aborto?
As mulheres que procuram abortos estão indo contra os ideais tradicionais que incluem a ideia de que o sexo é usado apenas para reprodução e que elas devem permanecer sexualmente puras, a menos que se envolvam no ato para fins reprodutivos. Essas crenças limitantes perpetuam o estigma do aborto, que leva a efeitos negativos internos e externos. Os efeitos internos são aqueles que a pessoa que busca o aborto vivencia devido à visão da sociedade sobre o aborto. Esses efeitos podem incluir sentimentos de vergonha, culpa, ansiedade e depressão. Os sentimentos antiaborto tendem a ser internalizados e podem causar graves problemas emocionais. Também pode ser difícil para a pessoa que está procurando um aborto e para a sua saúde mental, pois as suas experiências são muitas vezes silenciadas pela comunidade.
Em comunidades menores, também há repercussões externas que podem ocorrer se as mulheres discutirem sobre seus abortos. Por exemplo, elas podem ser rejeitadas por suas famílias, parceiros ou até mesmo amigos. Algumas mulheres também enfrentam críticas e abusos. Pode até ser perigoso falar sobre procurar ou fazer um aborto em algumas sociedades, já que muitas mulheres podem enfrentar assédio, agressão e discriminação. De fato, muitos manifestantes pró-vida assediam mulheres e profissionais de saúde na porta das clínicas de aborto.
Em muitos países da América Latina, houveram mudanças recentes nas leis que permitem o aborto em certos casos. No entanto, mesmo com as novas leis, muitas mulheres ainda enfrentam o estigma. Por exemplo, embora o Uruguai tenha descriminalizado o aborto em 2012, muitas mulheres ainda sentem repulsa e discriminação por parte dos profissionais de saúde anos após a mudança nas leis.
Além dos efeitos sobre as mulheres, também há efeitos do estigma do aborto na sociedade.
O estigma do aborto perpetua ideias ultrapassadas de normas de gênero e expressão do gênero feminino. Esses papéis de gênero incluem a ideia de que o papel da mulher é ser mãe e que as mulheres precisam ser femininas e puras. Também promove a crença de que o sexo deve ocorrer apenas entre casais com o propósito de gerar filhos.
Como os provedores e clínicas de aborto são afetados pelo estigma do aborto?
Em uma pesquisa internacional desenvolvida pela safe2choose e Ipas, buscamos compreender as experiências de acompanhantes e provedores de aborto em todo o mundo. O relatório contém estatísticas gritantes do estigma também enfrentado pelos provedores de aborto. Além do estigma social que profissionais de saúde que oferecem abortos enfrentam, o relatório descobriu que alguns deles, dependendo da região em que vivem, também estão sujeitos ao medo geral de perseguição ou falta de proteção legal nas sociedades às quais servem. Alguns relataram que os desafios mais significativos que enfrentam são os ambientes hostis em que trabalham, restrições legais e o medo de perseguição ou falta de proteção legal.
Os efeitos do estigma do aborto não afetam apenas as mulheres que procuram um aborto, mas também afetam profissionais de saúde que dispensam medicamentos abortivos. Médicos e outros profissionais de saúde muitas vezes são xingados e considerados pecadores em muitos países. Também houveram muitos casos em que médicos abortistas foram atacados e até mesmo mortos. Quando se trata de desafios do aborto, é importante lembrar que todas as pessoas que cercam o aborto também tendem a ser afetadas negativamente pelo estigma.
Portanto, embora possamos ver claramente os efeitos do estigma do aborto sobre os profissionais de saúde, devemos entender o que isso pode significar em termos de o provedor do aborto se sentir seguro e protegido o suficiente para poder realizar um aborto seguro sem medo de perseguição, escárnio e estigma. Profissionais de saúde que oferecem serviços de aborto só são capazes de fornecer um aborto seguro se estiverem em condições de sentir que seu trabalho é seguro e a sociedade não os julgará por realizar um procedimento médico e salvar a vida de muitas pessoas.
O que podemos fazer sobre o estigma do aborto?
Embora seja improvável que gerações dos efeitos do estigma do aborto se dissolvam rapidamente, ainda existem muitas maneiras de ajudar a prevenir o estigma. À medida que as organizações e os profissionais de saúde continuam educando o público, as mulheres terão mais poder para tomar suas próprias decisões sobre seus corpos. Aqueles que acreditam e transmitem o estigma também podem começar a mudar de ideia sobre o aborto quando ouvirem evidências baseadas em fatos sobre o assunto. Em essência, o estigma é a principal causa de abortos arriscados que têm efeitos fatais.
Grupos políticos, organizações e profissionais da política pró-escolha também devem continuar lutando pela descriminalização do aborto para que mais pessoas possam ter acesso ao aborto seguro. À medida que o aborto seguro se torna cada vez mais comum, as pessoas ouvirão mais histórias sobre como suas amigas e familiares foram capazes de realizar abortos seguros. Na safe2choose, nós também incentivamos as pessoas a compartilhar suas histórias, pois é dessa forma que elas poderão libertar a si mesmas e a outras. Isso também ajudaria a diminuir o estigma do aborto, uma vez que haverão menos pessoas para perpetuar o estigma cultural. Com o tempo, o apoio às mulheres que procuram pelo aborto e a profissionais de serviços de aborto deve eliminar o estigma do aborto e torná-lo mais seguro para as mulheres gerenciarem sua saúde reprodutiva.